Fui recentemente ver o filme "Zodiac", realizado por David Fincher a partir de um guião de James Vanderbilt. Como o Nuno Markl muito bem referiu no artigo que lhe dedicou, é um belo filme, com uma dramaturgia, um ritmo e um tom discreto que parecem vir de outros tempos. Mas, quanto a mim, falha num aspecto essencial que, sem lhe retirar todos os outros méritos, diminuiu muito a sua capacidade de me envolver emocionalmente. É a questão do protagonista.
O argumento de "Zodiac" parece debater-se durante muito tempo num dilema sobre quem é o verdadeiro protagonista da estória: será Robert Smith (Jake Gyllenhaal), o cartonista do jornal com um fraquinho por cifras e mistérios; Paul Avery (Robert Downey Jr.), o jornalista experiente mas com problemas de álcool; ou a dupla de polícias David Toschy (Mark Ruffalo) e William Armstrong (Anthony Edwards), que conduzem a investigação durante anos a fio? A estória salta de uns para os outros, mostrando os vários ângulos do caso a partir dos seus pontos de vista complementares.
Só quando, ao fim de muitos anos de investigação e decorrida metade do filme, todos os restantes "pseudo-protagonistas" vão abandonando o barco, por um motivo ou outro, é que o personagem de Jack Gyllenhaal assume as rédeas da estória. A partir desse momento ele transforma-se num homem obcecado pelo mistério do assassino do Zodíaco, tão empenhado na sua resolução que sacrifica por ela a sua vida familiar e profissional. Começa a investigar por conta própria, assedia os outros protagonistas procurando as pistas que eles possam ter deixado escapar, descobre novos dados e chega mesmo a encarar face a face o principal suspeito. Com essa tomada de iniciativa do enfim protagonista o filme ganha imediatamente uma outra força, mas nessa altura já é tarde demais – o "mal" está feito.
Esta opção do guionista do filme foi arriscada e admito que tenha sido intencional. Numa entrevista recolhida na net e em vários artigos de revistas de guionismo podemos ver que ele se empenhou durante um ano na escrita do guião. Não houve aqui pressas ou decisões irreflectidas. Mas o caminho escolhido teve uma consequência inevitável e indesejável. Quando James Vanderbilt decidiu não me estender a mão de um protagonista desde o início do filme, empurrou-me para uma posição mais distanciada e fria, e tornou-me um espectador externo dos eventos em cursos. De certa forma, obrigou-me a "ver" o filme, e não a "vivê-lo". Se era essa a sua intenção – mostrar-me a estória de uma forma neutra, quase documental – então parabéns, porque acertou em cheio. Mas sinto que com isso fui afastado da festa; fiquei do lado de fora, empoleirado na janela, cheio de inveja dos sortudos que conseguiram entrar.
Quer-me parecer que o facto de ter três protagonistas (eu reduziria a três), prejudica a emoção repartida por todo o filme, mas favorece os propósitos do argumentista e do realizador para este filme em particular, com características muito específicas mais na linha documental ou, pelo menos, nos sentimento da obsessão. Todos os outros protagonistas desistiram depois de muitos anos, muito tempo perdido e vidas prejudicadas. É aí que vem a maior emoção do filme, com Jake Gyllenhaal a partir numa senda, igualmente obcecada, mas com mais hipóteses de sucesso.
Claro que é um filme mais difícil de ver, não indo agradar as massas.
Gostei. Não me deslumbrou, não é um tipico filme de Fincher (e isso significa filme fenomenal, por norma), mas gostei bastante.
É verdade! Eu senti o mesmo. Um filme de Fincher, um tema que me interessa, uma estória que se apresentou demasiado lenta, dispersa e mesmo chata durante demasiado tempo. Admito que já nem tinha paciência para o vêr até ao fim, o que me pareceu muito estranho. Derepente, demasiado tarde, o filme acorda mas provavelmente já estavamos todos a dormir. Pelo menos isso, asim não foi uma desilusão total. Acho que a opcção do guionista retirou enfraqueceu a estória em demasia, o público tem de ser conquistado no incío do filme, mesmo que depois haja uma nova motivação.