Há três meses atrás não nos atreveríamos a isso, mas na viagem da próxima semana decidimos arriscar: desta vez não vamos levar a Sharon connosco para Portugal. A Sharon é a nossa cadela tekkel, e é incrivelmente medrosa.
Nos primeiros tempos que vivemos aqui em Angola era preciso arrastá-la para sair até à varanda do apartamento. O barulho, a confusão, provavelmente os cheiros de Luanda, tudo lhe metia medo, tudo a deixava de rabinho entre as pernas, escondida debaixo do sofá.
Na única viagem em que nos separámos dela, quando visitámos o Lubango, pedimos a um amigo que a visitasse para lhe dar água e comida. Passou os três dias em jejum.
Mas agora a Sharon parece outra.
Habituou-se ao seu novo ambiente e recuperou a confiança perdida. Costumamos deixar a porta da varanda aberta durante o dia e ela entra e sai a seu bel prazer. Como descobriu que os vizinhos têm um gato passa o tempo a sonhar com o momento em que o vai apanhar.
É verdade que quando saímos, durante a semana, não se entusiasma muito para ir connosco. Mas ao fim de semana, quando percebe que estamos a preparar as coisas da praia, posta-se de guarda à porta e é a primeira a deixar a casa.
Quando recebemos amigos para jantar, faz-nos companhia civilizadamente – normalmente deitada debaixo da mesa, bem encostada aos meus pés. E na praia já não corre, ladrando furiosamente, atrás de quem ouse aproximar-se a menos de cinco metros de nós. Está uma lady, a nossa Sharon.
Por isso resolvemos poupá-la ao stress da próxima viagem, às visitas a veterinários e serviços de saúde, aos calmantes e às 10 + 10 horas enfiada num caixote. Vai ficar em casa, sob a guarda do W. e da J., que vão lá ficar durante estes quinze dias (uma estadia no hotel
, como eles dizem). Achamos que vai sofrer menos assim.
É claro que vai sentir a nossa falta; é possível que não coma nos primeiros dois ou três dias; é provável que passe muitas horas deitada à frente da porta, à nossa espera, como costuma fazer quando eu saio para trabalhar. Mas feitas as contas pensamos que é o melhor para ela.
Nós voltamos, Sharon, não te preocupes. Mas vamos ter saudades tuas, lá isso vamos.