O último número da revista "Creative Screenwriting", que costumo ler regularmente, aborda em vários artigos os métodos de trabalho dos guionistas. É um tema habitual desta e doutras revistas de escrita, donde presumo que todos nós, os autores e candidatos a autores, vivemos fascinados com os segredos e truques dos nossos semelhantes. Provavelmente na esperança, sempre defraudada, de encontrar num desses artigos a fórmula mágica que nos permitirá passar a escrever sem dificuldades.
Nota importante: essa fórmula mágica não existe.
De qualquer forma, lembrei-me de fazer um apanhado de alguns dos textos da revista, à procura de diferenças e elementos comuns. Alguns exemplos:
Sobre Jared Hess & Jerusha Hess, marido e mulher, autores de "Gentlemen Broncos": "Depois de deixarem a estória incubar por vários meses, sentam-se finalmente para trabalhar no guião. Jared admite que o seu tempo de brainstorming pode demorar o dobro do tempo físico que demoram a escrever os guiões. "Temos sempre connosco uns cadernos de notas para quando as ideias surgem," diz-nos. "Mas depois usamos um quadro branco para delinear todo o filme"."
Sobre Peter Straughan, autor de "The men who stare at goats": ""Limitei-me a deixar a estória ir para onde queria," diz-nos ele. "Gostei bastante que ela tivesse esta bizarra, desordenada forma de energia própria". Straughan não tinha um outline mas trabalhou a partir de uma simples lista de elementos e episódios do livro, que tencionava ir encaixando no guião à medida que avançava. Doze semanas depois tinha uma primeira versão sólida".
Sobre Melissa Rosenberg, autora de "The Twilight Saga: New Moon": ""Para todos estes filmes, comecei sempre com um outline de 25 páginas a um espaço," diz-nos Melissa. "Sempre fiz outlines muito detalhados, para ter a certeza de que todas as pessoas envolvidas sabem perfeitamente o que estou a fazer e o que pretendo fazer, e não haja mais tarde surpresas desagradáveis."".
Sobre Anthony Peckham, autor de "Invictus": "Peckham faz questão de escrever todos os dias da semana das oito à uma, sempre no seu escritório. Se necessário, escreve também à tarde, das três às seis – embora explique que este horário vespertino é usado normalmente para fazer revisões e planear o trabalho do dia seguinte. Conforme nos explica, "Tento seguir o ditame de Hemingway de que devemos parar de escrever antes de chegar ao fim, para termos sempre por onde começar no dia seguinte"."
Sobre James V. Simpson, autor de "Armored": "Durante anos antes da venda (do guião), Simpson teve como norma escrever cinco dias por semana, das nove às cinco todos os dias. Essa disciplina permitiu-lhe facilmente calçar os sapatos de um escritor profissional e entregar as suas reescritas a tempo e horas. "Se eu fosse um desses tipos que só escrevem quando estão para aí virados," observa Simpson, "não teria sido capaz de respeitar os meus prazos".
Sobre Wes Anderson e Noah Baumbach, autores de "Fantastic Mr. Fox": "Para esse efeito (encontrar ideias adicionais para a estória) os dois foram para Paris terminar o guião, e passaram o tempo, como Baumbach descreve, "a escrever no Parc Monceau e a tentar encontrar o café perfeito".
Sobre Pedro Almodóvar, autor de "Abrazos Rotos": "Quanto aos seus hábitos, Almodóvar escreve todos os dias – esteja onde estiver. Na maior parte dos dias toma apenas notas sobre estórias que ouviu ou leu, mas certifica-se sempre que a escrita faça parte da sua rotina diária. (…) Quando finalmente se compromete com a escrita de um determinado guião, trabalha nele entre quatro a seis horas por dia, durante pelo menos seis meses. Normalmente isto produz oito ou nove versões do guião, sendo que os atores entram no processo na quarta ou quinta versão."
Sobre Julian Fellowes, autor de "The Young Victoria": "No que se refere aos seus hábitos, Fellowes começa a escrever entre as 09:15 e as 09:30 da manhã, pára a meio do dia para almoçar, e continua até às sete da tarde. Diz-nos que as suas melhores ideias costumam vir de manhã, por isso na sessão da tarde dedica-se mais a revisões".
O que podemos tirar daqui? Em primeiro lugar, que há tantos métodos de trabalho quanto escritores. Uns fazem extensos outlines, outros partem aventurosamente para a escrita; uns escrevem só de manhã, outros o dia inteiro. Faz parte do percurso de cada escritor descobrir a forma mais adequada para dar forma à sua imaginação.
Em segundo lugar, todos estes depoimentos nos fazem suspeitar perigosamente de que escrever um guião é um trabalho a sério. Bem, todos menos, talvez, o do Parc Monceau e a busca do café perfeito.
Se algum candidato a guionista espera encontrar nesta profissão uma via fácil e rápida para o sucesso, pode arrumar já as botinhas. Não o é nos Estados Unidos, e muito menos aqui, onde os guiões nem sequer são bem pagos.
Gostaria de compartilhar aqui, também, meus métodos de trabalho… Eu me sinto mais criativo durante as noites (assim como Shonda Rhimes, de Grey’s Anatomy), então dedico minhas manhãs e tardes a pesquisas e revisões. Geralmente durante o dia preparo tudo aquilo que pretendo escrever pela noite, isso quando já tenho um roteiro para trabalhar.
O que não é o caso hoje, por exemplo, estou na construção de personagens para a minha série de TV que pretendo levar para alguma produtora até o meio do ano.
Infelizmente não posso me chamar de um “roteirista profissional” ainda, mas se Deus quiser e o trabalho for bom, vocês ainda vão ver minhas histórias! XD
Assim se comprova que cada autor tem de encontrar o ritmo mais adequado às suas características psicológicas e fisiológicas, e ao estilo de vida que leva. O seu é nocturno, e se já percebeu isso está um passo à frente.
Boas escritas e boa sorte com a sua série de TV.
gostei muito do seu texto
Obrigado.
gostei muito do texto