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Doze antagonistas invulgares

    Num dos artigos do Curso de Guião defini o antagonista como “o personagem que representa a principal força opositora ao protagonista”.

    O antagonista tem os seus objectivos próprios, que estão em conflito directo com os do protagonista. Uma vezes ele quer o mesmo que o protagonista (o tesouro, a princesa, o reconhecimento, etc.); outras procura exactamente o seu oposto (a sua derrota, o seu silêncio, o fim do mundo, etc.).

    Dado que, como também é referido no Curso, o interesse de uma estória nasce da fórmula Drama = Conflito + Surpresas, é fácil entender que o papel do antagonista, enquanto principal gerador de conflito e fonte de muitas das surpresas, é tão importante quanto o do protagonista.

    Chapéu branco e chapéu preto

    Na grande maioria das estórias o antagonista é uma figura bem identificada e fácil de entender, com características de alguma forma análogas às do protagonista: é o cowboy do chapéu preto; o chefe mafioso; o serial killer; o raptor; o político corrupto; ou até mesmo o exterminador vindo do futuro.

    Mas é possível, e vantajoso, pensar em antagonistas mais diversificados, com características completamente diferentes das do protagonista.

    Estes antagonistas pouco usuais podem servir como antagonistas principais, segundo a definição acima referida, mas também podem ser usados como forças antagónicas complementares, que vêm apimentar a trama e diversificar as fontes de conflito.

    Vejamos então uma dúzia de tipos de antagonistas menos comuns que podemos considerar nas nossas estórias.

    Doenças ou limitações físicas

    Em filmes como O Meu Nome é Alice, Amigos Improváveis ou O Paciente Inglês, a existência de uma doença (Alzheimer), de uma limitação física (quadriplegia) ou das marcas de um acidente (queimaduras) são a principal fonte do conflito; sem eles a estória não existiria.

    Noutros filmes, como A Selva ou Janela Indiscreta, um episódio importante pode estar associado a uma situação de doença ou limitação física.

    Vícios

    A luta dos protagonistas contra os seus próprios vícios – álcool, drogas, jogo – estão na raiz de grandes filmes como Leaving Las Vegas ou Requiem for a Dream.

    Noutros filmes, os vícios servem como dificuldades adicionais ou características definidoras dos protagonistas. É o caso, por exemplo, de Goodfellas ou The Big Lebowski.

    A personalidade do protagonista

    Em muitas obras a personalidade, extremista ou auto-destrutiva, do protagonista é o principal obstáculo que ele tem de enfrentar. Pense-se, por exemplo, em O Lobo de Wall Street ou em Beleza Americana.

    Com mais frequência, essas características de personalidade tornam-se obstáculos adicionais no caminho dos protagonistas, como acontece em O Apartamento ou O Caçador.

    O próprio protagonista

    Um caso muito especial, e mais difícil de aplicar noutras estórias, é quando o protagonista é também, fisicamente, o próprio antagonista. É o que se passa em filmes como Looper, O 6º Dia ou o recente Upgrade.

    Um caso ainda mais particular pode ser encontrado na cena de Evil Dead em que o antagonista era a própria mão decepada do herói, animada pelo espírito maligno que o assombrava.

    A sociedade

    Muitas vezes a luta dos protagonistas é contra a sociedade em geral, normalmente personificada através de uma ou mais figuras. Alguns exemplos bem conhecidos são os filmes Dallas Buyers Club e Brazil, ou uma série excelente como The Handmaid’s Tale.

    Um vírus ou doença contagiosa

    Combater a propagação de um vírus, verdadeiro ou ficcional, está na origem de muitos filmes de grande sucesso, como  Outbreak – Fora de Controlo, Contágio ou World War Z.

    A memória

    As limitações da memória são, muitas vezes, a raiz dos problemas do protagonista. Isso acontece, de uma forma mais discreta, em Lion ou, de forma mais radical, num filme tão invulgar como Memento.

    O tempo

    A criação de limites temporais bem definidos é uma das ferramentas mais comuns para aumentar a tensão dramática numa estória. São as famosas bombas relógio, de que falei num artigo do Curso de Guião.

    Mas por vezes o tempo é mesmo o obstáculo principal que o protagonista tem de superar para alcançar o seu objetivo. Vejam-se os casos de filmes como 127 Horas ou, de forma ainda mais invulgar, O Estranho Caso de Benjamin Button.

    A tradição

    Os hábitos e costumes de uma cultura são muitas vezes a principal dificuldade enfrentada pelos protagonistas. Veja-se o que acontece em Uma Separação ou no popular Billy Elliot.

    Com mais frequência, estas tradições constituem forças antagónicas adicionais, que contribuem para dificultar o progresso dos protagonistas. Podemos encontrar bons exemplos em Gran Torino ou O Herói de Hacksaw Ridge.

    O meio ambiente

    Em filmes como O Marciano, The Warriors – Os Selvagens da Noite ou O Lado Selvagem o território hostil onde os protagonistas se movem é o seu principal obstáculo.

    Noutros casos, como em The Grey – A Presa ou no clássico Lawrence da Arábia, o meio ambiente é uma dificuldade adicional que os heróis têm de superar para alcançar o seu objectivo.

    A meteorologia

    Fenómenos meteorológicos excepcionais estão na origem de filmes como A Tempestade Perfeita, Tornado ou até o inqualificável Sharknado.

    Noutras obras, como Águas Mortíferas,  Mad Max: Estrada da Fúria ou The Equalizer 2, fenómenos meteorológicos como uma inundação, uma tempestade de areia ou um tufão desempenham um papel fundamental no desenrolar da estória.

    Uma catástrofe

    Finalmente, não poderia deixar de referir os cataclismos, efectivos ou potenciais, que estão na origem de tantos filmes-catástrofe de grande sucesso. Filmes como O Impossível, Armageddon ou San Andreas demonstram três abordagens completamente diferentes a este popular género.

    Conclusão

    Os guionistas estão permanentemente à procura de ideias para novas estórias. É um exercício quase instintivo, e tão divertido quanto útil.

    Como expliquei no Curso de Guião estas ideias começam normalmente pela conjugação de um protagonista, um objectivo e um antagonista de peso.

    Diversificando o tipo e as características dos antagonistas que consideramos, com os exemplos acima referidos, conseguimos ampliar exponencialmente o género de ideias que vamos gerar.

    1 comentário em “Doze antagonistas invulgares”

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