Em Porto Quipiri, perto da ponte sobre o Rio Dande, está o monumento mais estranho que encontrei em toda a minha vida. Seguramente alguém atribuiu algum significado aquela imagem de um crocodilo que mastiga um cifrão, rodeado de crianças que parecem adorá-lo. Não consigo imaginar quem, nem o que quis dizer com a obra; e, infelizmente, não tive tempo de falar com nenhum habitante da povoação que me pudesse revelar o seu simbolismo escondido.

Fotografei-o no regresso a casa, depois de um dia bem-passado com os meus colegas C. e R. Fomos almoçar à barra do Dande, numa sossegada tascazinha ao ar livre. Ainda não conhecera esta zona a norte de Luanda, seguindo pela estrada do Cacuaco. Não é uma paisagem tão bonita como a que encontramos para o Sul, a caminho de Cabo Ledo, mas tem os seus motivos de interesse.

A vegetação varia muito: passamos da savana salpicada de embondeiros para zonas de palmeiral, que por sua vez se transformam em densos mangais e campos de bananeiras, para regressar depois aos descampados mais áridos. E pelo meio, sem uma lógica aparente, pequenas povoações e aldeolas de cubatas, fábricas abandonadas ou em funcionamento, fazendas e musseques, numa mistura desordenada e algo caótica.
Não é o melhor que Angola tem para mostrar. Mas a barra do Dande merece uma visita. É uma aldeia de pescadores, já com alguma infraestrutura urbana. O restaurante situa-se perto da foz do rio e o ambiente é calmo e descontraído. Comi um linguado grelhado, delicioso, precedido por uma lagosta pequena, mas saborosa. Acompanhado, ao jeito angolano, por mandioca e feijão de palma.
Estão a construir (ou reconstruir) a ponte para o outro lado, que parece ainda mais calmo, com as suas casinhas rodeadas de palmeiras. Os barcos de pescadores, mais sofisticados do que os das aldeias do Sul, não paravam de cruzar as águas mansas. Passeei um pouco, tirei fotografias, foi uma variação agradável dos meus fins de semana mais recentes que, para ser sincero, têm sido um pouco monótonos. Por culpa minha, devo acrescentar, que não faço grande coisa para os animar.
A seguir ao almoço fomos um pouco mais para norte, até ao Caxito. Cidade engraçada, estendida preguiçosamente ao longo da estrada principal, espraiando-se pelo meio das árvores e das valas de irrigação secas nesta altura do ano.
Parámos no hotel do Bengo, inaugurado a 6 de Abril de 2006, para tomar um café e um Cutty Sark. É um hotel novinho em folha, que me fez lembrar os hotéis que há em todas as pequenas cidades de província em Portugal e que, além da tarifa de 85 USD por noite, oferece um horário de conveniência de 2 horas por 20 dólares. Não o aproveitámos, obviamente, mas achei graça à designação que encontraram para esse “negócio paralelo”.
No regresso parei para tirar algumas fotos a uma fábrica abandonado. Distraído com a paisagem, pisei um tronco de madeira que me atravessou a sola da havaiana e me fez um buraco no pé. E a fotografia nem ficou muito boa…
Em Kinfandongo, onde se travou uma das maiores batalhas da guerra civil, há outro monumento de significado mais facilmente compreensível do que o “crocodilo anticapitalista”: uma imponente estátua de soldados com armas e uma bandeira. Não parámos; monumentos militares são mais vulgares e, francamente, muito menos interessantes.
Trata-se de uma figura associada a uma mítica história de um crocodilo que terá pago imposto as autoridades coloniais a mando de um angolano em protesto àquela prática.
Diz-se que o administrador do posto, apavorado, suspendeu a obrigatoriedade do pagamento do tributo.
Sem a profundidade necessária, espero ter ajudado a compreender o monumento do “Jacaré Bangão”. Bangão é calão local que significa janota.
ESTÁTUA DO JACARÉ BANGÃO
CAXITO – BENGO
A Estátua do Jacaré Bangão situado no Bairro da Quijanda, representa um feiticeiro mítico, que se transformou em Jacaré para aterrorizar os cobradores de impostos. Com um saco de dinheiro na boca, esta estátua é também um símbolo à resistência dos locais da exploração colonial.
Obrigado, Aldrabão Justo e Kurcudilo, pelo esclarecimento. Anos mais tarde ouvi essa explicação da boca de amigos, mas nunca me lembrei de vir aqui atualizar o artigo.