Há duas semanas publiquei no meu Twitter um link para um artigo do blogue My Name is Not Bob. O tuíte foi bem recebido, por isso achei interessante desenvolvê-lo aqui no site.
Por ano são publicados nos Estados Unidos quase 300.000 novos livros. No Reino Unido o valor ronda os 200.000. Em Portugal fica pouco abaixo dos 8.000.
Estes números, que parecem espantosos, criam um curioso paradoxo. Nunca foi tão fácil publicar um livro como nos nossos dias, mas também nunca foi tão difícil fazer com que esse livro seja descoberto pelo público a que se destina.
Além disso, as próprias editoras dedicam cada vez menos tempo e meios à divulgação e promoção desse manancial de novos livros. Preferem compreensivelmente concentrar os seus recursos, sempre escassos, em autores já conhecidos (escritores com sucessos anteriores, ou figuras públicas), que oferecem logo à partida uma maior garantia de impacto e penetração.
É por estas razões que, salvo raríssimas exceções, o paradigma tradicional do escritor enfiado na toca, dedicado apenas à sua arte, deixou de ser válido. O escritor moderno tem de desempenhar por sua conta muitas das tarefas que tradicionalmente competiam às editoras.
É exatamente essa multiplicação de papéis que o artigo de Robert Lee Brewer aborda, listando as oito profissões que os escritores contemporâneos são obrigados a desempenhar.
E que profissões são essas, segundo o autor? A lista que se segue acompanha a ordem do artigo, mas com os meus próprios comentários e adendas.
- Escritor – é um bom sinal que a responsabilidade por escrever ainda surja em primeiro lugar. Se não tivermos o material de base, dificilmente qualquer uma das outras fará sentido.
- Revisor – os revisores atuais soçobram debaixo da chuva de manuscritos que lhes chegam, e dedicam muito menos tempo a cada um. O que esperam, no mínimo, é que as obras lhes cheguem sem erros ortográficos e gramaticais. Esse é um dos pontos em que eu insisto no meu ebook (grátis) sobre reescrita.
- Redator – hoje um escritor não escreve apenas os seus livros ou argumentos. Escreve também artigos no seu blogue e para a imprensa tradicional; publica tuítes e atualizações no Facebook; escreve comunicados de imprensa e perfis autobiográficos; escreve sinopses, propostas de livros, apresentações de projetos. Todas essas formas de escrita têm exigências, truques e estilos particulares que obrigam o escritor a testar permanentemente a sua versatilidade.
- Arquivista – a nossa vida não está a ficar mais simples, infelizmente. Cada vez há mais documentos que é preciso guardar, atualizar, rever periodicamente: faturas, recibos de despesas, correspondência, relatórios, propostas, notas, etc. Neste ponto eu deixo muito a desejar, e foi bom ser recordado disso.
- Negociador – supostamente é para isso que os agentes servem. Mas na prática as coisas não funcionam bem assim, pelo menos para o comum dos mortais. Por isso é bom afinar as competências nessa área e, sobretudo, não ter vergonha de lutar pelos próprios interesses.
- Contabilista – acho que este ponto está intimamente relacionado com o número quatro. Pessoalmente teria combinado os dois e deixado a lista com sete alíneas, número cheio de simbolismo e ressonância bíblica. Mas o autor quis dar-lhe um destaque especial, e quem sou eu para discordar.
- Marketeiro – o escritor moderno tem de se autopromover e cuidar da sua audiência – a sua plataforma, como eu referi num artigo recente. Isto implica mais uma meia dúzia de competências novas e, como o autor bem refere, a necessidade de ultrapassarmos a timidez e introversão que caraterizam tantos de nós.
- Orador – a necessidade de promoção e divulgação do nosso trabalho obriga-nos a enfrentar audiências diversas cada vez com mais frequência. Seja em entrevistas, debates e conferências, seja em apresentações ao vivo ou em pitches privados, os escritores atuais têm de ser capazes de defender e promover a sua obra em público. A timidez não é uma opção.
O artigo é muito interessante e merece uma leitura atenta para além destes meus destaques e comentários. Pode lê-lo (em inglês) aqui.
Se me permitem acrescento mais um; JORNALISTA. Em Portugal é raro o jornalista que não escreveu um livro: