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Como escrever um filme ao jeito da Pixar

    O excelente site de guionismo Go Into The Story publicou recentemente uma também excelente entrevista com Mary Colemant, chefe de desenvolvimento da Pixar. A sua responsabilidade na empresa é estabelecer a ponte entre os realizadores e os guionistas durante o processo de desenvolvimento dos filmes.

    Dado que a Pixar é o estúdio mais bem sucedido da história do cinema, com 12 sucessos mundiais em 12 filmes produzidos, é bom tentar perceber como é que eles conseguem escrever um filme após outro sem baixar o nível.

    Qual é a fórmula Pixar?

    A resposta é uma desilusão para quem queira soluções fáceis e de aplicação imediata. Não há fórmula secreta. “É apenas trabalho duro, e persistir até ultrapassar os momentos difíceis“.

    Mas a leitura da entrevista mostra que há um método de trabalho, muito específico, próprio da cultura da empresa. Esse processo é explicado com bastante detalhe ao longo da entrevista, mas não resisto a selecionar e traduzir alguns pontos mais importantes.

    “O termo certo é mesmo oficina. (…) Na Pixar demoramos anos, cerca de cinco anos, para acertar com a estória.

    Vai haver versões que não funcionam, mas em vez de entrar em pânico (..) temos de confiar no nosso processo de desenvolvimento de longo prazo.

    A tecnologia é sempre uma ferramenta ao serviço da estória. (…) Podemos ter inventado novos e espetaculares softwares, mas quando entramos na estória confiamos nos fundamentos da dramaturgia.

    Não temos vergonha dos sentimentos.

    Somos muito influenciados por Hitchcock. Os seus filmes são sempre cheios de surpresas.

    [Os realizadores] são desafiados a apresentar três ideias originais. O John [Lasseter] ouve e escolhe a que ele achar mais promissora para a Pixar.

    Quando a ideia é escolhida passamos cerca de uma ano a fazer pesquisa (…) e a explorar esse mundo e os personagens que podemos encontrar nele.

    O mais importante é encontrar o núcleo da estória.

    Começamos com outlines (escaleta) muito vagas, que são apresentadas regularmente ao Brain Trust – um grupo dos outros realizadores d Pixar. Esse é um dos aspetos mais caraterísticos da Pixar; recebemos opiniões e comentários dos nossos colegas. E são colegas tão empenhados no nosso sucesso como no seu próprio.

    Muitas vezes passamos um ano inteiro na fase de outline antes de escrevermos a primeira versão do guião. 

    A segunda versão do guião (…) é sempre má. Realmente má. Mas tudo bem.

    Fazemos sempre muito mais de oito versões do guião. A certa altura perdemos a conta.

    Fazer alterações é caro e trabalhoso, mas continuamos nisso até acertar completamente a estória. Nunca entrámos em produção com o guião completamente fechado.

    Se olharmos para os nossos filmes há sempre um protagonista que começa com um defeito, embarca numa viagem, e sai do outro lado uma melhor pessoa… ou rato… ou peixe.

    O motor das nossas estórias não são apenas os personagens; são as relações entre os personagens.

    Por um lado sempre antropomorfisamos os nossos personagens. Mas por outro lado sempre tentamos ser verdadeiros em relação ao seu ponto de vista sobre o mundo.

    [O que faz uma boa estória?:] Acho que isto pode soar brega, mas já referi antes que não temos medo dos sentimentos, por isso aqui vai… é vir do fundo do coração. Contar uma estória do fundo do coração. Todos os outros mecanismos da dramaturgia são inúteis sem isso.”

    Uma vez mais – a entrevista é sensacional. Pode encontrá-la aqui, dividida em seis partes: 1, 2, 3, 4, 5, 6

    Como brinde, a conferência de Andrew Stanton no TED, em que ele toca em alguns dos mesmos pontos (e conta uma anedota hilariante).

    E mais uma apresentação de Andrew Stanton, desta vez no Google. Eu sei que o filme John Carter não é da Pixar, mas o Andrew é. E é muito divertido.

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