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Perguntas & Respostas: qual a diferença entre guião, roteiro e argumento?

    Qual é a diferença entre guião, roteiro e  argumento? E entre um argumentista e um guionista? É exactamente a mesma coisa? Qual a subtil diferença que leva a escolher um ou outro termo? – Marta

    Marta, conforme refiro no segundo artigo do Curso de Guião, um Guião ou, no Brasil, um Roteiro, é um documento escrito que:

    1. apresenta as cenas que compõem um filme, na ordem sequencial em que serão vistas;
    2. e, dentro de cada cena, descreve as acções e diálogos dos personagens e todos os aspectos visíveis e audíveis do filme.

    Em suma, é um documento onde deve ficar registado tudo o que se vai ver e ouvir no filme. Como tal, é o documento chave para toda a produção do filme.

    É com base no guião que o filme consegue atrair interesse e financiamentos; é ele que serve de referência para o planeamento e orçamentação da produção; é o guião que o realizador e todos os técnicos seguem para criar o filme; é ao guião que os atores vão buscar os diálogos e as ações dos personagens.

    O Guionista, ou Roteirista, no Brasil, é o autor do guião/roteiro. É um profissional altamente qualificado, que une a imaginação criativa com o rigor técnico; o conhecimento profundo da linguagem do cinema e da arte de construir uma estória audiovisual, com a capacidade artística e técnica para transpor essa estória para uma forma escrita.

    Num artigo recente mostro o aspecto de uma página de guião, explicando todos os seus elementos e indicando a sua formatação correta. Na minha página de Recursos estão também disponíveis alguns guiões, e links para sites que oferecem muitos outros.

    Guião O Padrinho

    E o Argumento?

    Um Argumento, em sentido estrito, é um outro tipo de documento, que precede o guião no processo de desenvolvimento.

    É uma descrição literária e sequencial do filme, em texto corrido, que não está ainda dividido por cenas (embora elas estejam normalmente já implícitas) nem inclui os diálogos dos personagens.

    Tal como o guião, o argumento é escrito no presente e na 3ª pessoa: “Jorge descobre que Adriana o anda a enganar com Flávio”. É, no entanto, um documento menos detalhado – cada página de um argumento converte-se em várias (5 a 10) páginas no guião.

    Donde vem a confusão?

    A confusão surge porque hoje usamos muitas vezes as duas expressões (Guião/Roteiro e Argumento) como sinónimos, referindo-nos ao documento escrito final – o guião. Da mesma forma, usamos muitas vezes Argumentista e Guionista (ou Roteirista) como sinónimos.

    Por exemplo, em Portugal, a entidade que representa os interesses dos guionistas é a APAD – Associação Portuguesa dos Argumentistas e Dramaturgos.

    Eu próprio uso os termos alternadamente sem qualquer problema. O meu último livro eletrónico, por exemplo, chama-se “Como Escrever o seu Primeiro Argumento Cinematográfico em Trinta Dias” e o seu objetivo é apresentar um plano de trabalho para chegar ao fim de um mês com uma primeira versão de um guião/roteiro de cinema.

    Para confundir ainda mais as coisas, há ainda outros termos que se ouvem no processo de desenvolvimento de uma estória audiovisual: logline, escaleta, outline, sinopse, tratamento, etc.

    Já falei detalhadamente sobre esses diversos tipos de documentos em outros artigos do Curso, como por exemplo este, sobre as loglines; ou este, que apresenta as várias etapas do desenvolvimento. Recomendo a sua leitura para uma descrição mais completa.

    Resumidamente, podemos guiar-nos por estas definições:

    Logline – é a descrição dos três elementos de uma estória – protagonista, objetivo e obstáculo – da forma mais sintética e atrativa possível, normalmente em apenas um parágrafo.

    Storyline – é uma versão ligeiramente mais completa da logline, em que se indica também a conclusão.

    Sinopse – é um documento sintético, de 1 a 3 páginas, em que se contra o princípio, meio e fim da estória.

    Pitch – é a versão falada da sinopse, preparada e otimizada para ser contada em voz alta a um ouvinte. Uma variação é o “elevator pitch“, ou seja, um pitch muito sintético e atrativo que pode ser usado num período tão curto quanto uma viagem de elevador com um potencial interessado.

    Tratamento ou Argumento – é uma sinopse mais longa e envolvente, que se lê quase como um conto. Pode ter entre 5 e 30 páginas. Se for muito mais longo, e incluir trechos de diálogos, pode ser tratado por “scriptment”, uma mistura entre “script” e “treatment”. O tratamento é o que corresponde mais de perto ao sentido tradicional em que se usava a palavra Argumento.

    Outline, ou escaleta, ou ainda grelha – é um documento no qual resumimos todos os eventos do nosso enredo passo a passo, em frases simples. No step outline esse resumo é feito cena a cena, com um detalhe ainda maior. É normalmente a última etapa antes da passagem à escrita do guião/roteiro.

    Guião/Roteiro Literário – é o guião escrito pelo guionista/roteirista, para descrever o filme da forma mais atractiva e interessante possível. Inclui o mínimo possível de indicações técnicas e normalmente as cenas não estão numeradas.

    Guião/Roteiro Especulativo – usa-se esta designação (sem qualquer sentido depreciativo) quando o guião é escrito por iniciativa do próprio autor, sem ser encomenda de ninguém.

    Guião/Roteiro de Rodagem, ou Shooting Script – é um guião revisto depois do guionista/roteirista já ter trabalhado com o realizador e outros elementos da equipa de produção. Como tal, é muito mais pormenorizado e inclui bastantes indicações técnicas. As cenas já estão numeradas e podem ser indicados ângulos e movimentos de câmara, e detalhes de produção.

    Conclusão

    A nossa actividade não é como a matemática ou a física, em que as coisas têm definições estritas e universais; há muito mais margem para variação e interpretação. Por isso, Marta, quando um produtor lhe encomendar, por exemplo, um argumento, certifique-se exatamente a que tipo de documento ele está a referir-se.

    No dia a dia, contudo, e para simplificar, use guião/roteiro ou argumento quando se referir ao documento final, tal como eu faço aqui no blogue. O mesmo quanto a guionista/roteirista e argumentista.

    Já quanto aos outros documentos referidos, é melhor usá-los sempre de acordo com as definições que proponho acima, para facilitar o entendimento.

    14 comentários em “Perguntas & Respostas: qual a diferença entre guião, roteiro e argumento?”

    1. João, ótimo texto. Sou brasileiro e estou iniciando-me no roteiro — não de TV ou cinema, mas de quadrinhos (ou bandas desenhadas, em Portugal). Seu texto foi bem explicativo e me ajudou a entender a razão de alguns colegas chamarem meus roteiros de especulativos. O tal do elevator pitch também chamou muito minha atenção.
      Obrigado!

    2. Olá!
      Muito bom esse esclarecimento,estou tentando uma colocação no mercado e gostaria de saber onde eu posso buscar uma vaga de argumentista mesmo que seja freelancer.
      Obrigado.

    3. Erick Linhares de Holanda

      João Nunes, excelente artigo, muito obrigado pelas informações deste e o do seu blog sobre argumento. Muito bom mesmo!

    4. Parabéns pelo artigo, que está muito bem explícito!

      Sou Angolano. Como compositor que sou, tenciono dar um outro passo e achei esse artigo muito bom.

    5. GABRIEL MANASFI DE MEDEIROS

      muito bom parabéns…estou estudando sobre roteiro…e aprendi agora a dividir as coisas sem confusão

    6. Boa Tarde João.
      Muito bom material.
      Você pode indicar algum site que disponibilize argumentos? Pode ser em português, inglês ou espanhol.
      Atenciosamente,
      Caré

    7. Olá Boa Tarde João.
      Muito bom material.
      Você pode indicar algum site que disponibilize argumentos? Pode ser em português, inglês ou espanhol.
      Atenciosamente,
      Pedro

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