Encontrei recentemente um vídeo com uma aula do guionista, autor e professor norte-americano Eric Edson, onde ele apresenta um resumo da sua teoria dramática para a escrita de guiões comercialmente bem sucedidos, a que chama The Story Solution. Escrever um guião de sucesso é o seu objetivo? Então leia este artigo e descubra se Eric Edson é o guru que faltava na sua vida.
Quem é Eric Edson?
Eric Edson é um guionista que, segundo o seu resumo biográfico, já escreveu dezassete argumentos de longa-metragem para empresas como a Sony ou a Warner Brothers, além de outros para televisão. É também Professor de Argumento e Diretor do Programa de Pós-Graduação em Argumento na Universidade Estatal da Califórnia, Northridge, e dá palestras no Programa de Escritores da UCLA Extension, o maior centro de formação de argumentistas do mundo.
Além disso, Edson é autor do livro The Story Solution, onde “revela as 23 ações utilizadas em todos os filmes de sucesso para criar heróis dinâmicos e tridimensionais, ligando todas as partes de um argumento cativante da primeira à última página.”
Esta informação, e muita mais, pode ser encontrada no seu site The Story Solution, que revela ainda uma parceria com o aplicativo de escrita Final Draft.
A Story Solution
Para Eric Edson, as bases de um bom guião são o conflito e a mudança, o que é outra maneira de resumir a minha própria Fórmula do Drama:
Drama = Conflito + Surpresa
Esta fórmula mágica, que partilho com os alunos dos meus workshops, é apenas uma mnemónica para tornar mais viva a necessidade de alimentar a “máquina de transformação” que todas as estórias são com dois tipos de combustível: a superação de obstáculos e a descoberta de novas informações.
Eric Edson designa as unidades individuais da mudança por Hero Goal Sequences. A definição que encontramos no seu site para estas sequências limitadas que, agregadas, compõem a estória geral é a seguinte:
Uma Hero Goal Sequence (Sequência de Objetivos do Herói) consiste geralmente em 2 a 8 páginas de guião (2 a 8 minutos de filme) em que o herói persegue um único objetivo físico, visível e de curto prazo como um passo imediato para alcançar o principal objetivo geral da história que conduz o enredo. A Sequência de Objetivos termina quando o herói descobre notícias frescas (fresh news), os quais são uma nova forma de informação que efetivamente acaba com a necessidade de perseguir o objetivo atual e cria um novo objetivo físico, visível e de curto prazo — iniciando assim a próxima Sequência de Objetivos do Herói. A notícia fresca, ou fornece o próximo objetivo a curto prazo do herói, ou envia o herói numa curta busca para o encontrar.
Todos os filmes americanos de sucesso comercial com um só herói contêm entre 20 e 23 sequências de objetivos do herói. O Primeiro Ato contém sempre 6 Sequências de Objetivos do Herói, e a Surpresa Estonteante Um (Stunning Surprise One) ocorre sempre como as notícias frescas da sequência #6. O segundo ato contém sempre mais 12 Sequências de Objetivos do Herói, e a sequência do Ponto Médio ocorre sempre durante a Sequência de Objetivos do Herói n.º 12 — enquanto a Surpresa Estonteante Dois (Stunning Surprise One) chega sempre como a notícia fresca na sequência n.º 18. O terceiro ato contém um mínimo de 2 Sequências de Objetivos do Herói e um máximo de 5.
A Story Solution em vídeo
Num vídeo de uma aula de Eric Edson, o autor desenvolve esta definição com mais algum detalhe e exemplos. Se domina a língua inglesa, sugiro que o assista por completo.
Caso contrário, deixo aqui os pontos principais da aula, muito resumidos:
- As Sequências de Objetivos do Herói (Hero Goal Sequences) consistem em sequências de 3 a 7 páginas de guião nas quais o herói persegue um objetivo físico/material de curto prazo que constitui uma etapa concreta para alcançar a vitória no fim da estória.
- Quando termina uma Hero Goal Sequence o herói descobre alguma informação nova e inesperada (new and fresh information) que dá por terminado o objetivo atual e define um novo objetivo, dando início a uma nova Hero Goal Sequence.
- O 1.º ato de qualquer filme que tenha tido sucesso comercial tem exatamente 6 Hero Goal Sequences.
- O 2.º ato, parte A, tem também sempre 6 Hero Goal Sequences.
- O mesmo se passa com o 2.º ato, parte B, que conta com outras 6 Hero Goal Sequences.
- O 3.º ato pode variar entre 2 e 5 Hero Goal Sequences.
- Feitas as contas, teremos que a meta de qualquer guionista para escrever um guião bem recebido pelas audiências, independentemente do seu género, será criar 6 + 6 + 6+(2 a 5)=20 a 23 Hero Goal Sequences, com 21 sendo um bom objetivo a perseguir.
- Escrevendo 21 sequências com uma média de 5 páginas para cada uma, teremos um guião de 105 páginas, perfeitamente nos parâmetros das longas-metragens comerciais.
- O objetivo do guionista é respeitar escrupulosamente estes parâmetros, tendo ainda em atenção dois outros aspetos importantes: cada umas das Hero Goal Sequences deve ser totalmente diferente de todas as outras; e o herói/protagonista tem de ser sempre ativo ao longo da estória, perseguindo cada um desses objetivos parciais.
- As Hero Goal Sequences n.º 6 e n.º 18 são as que no seu final têm uma informação nova e inesperada (new and fresh information) suficientemente impactante para mudar radicalmente o rumo da estória, marcando respetivamente a transição do 1.º para o 2.º ato, e do 2.º para o 3.º ato.
Não li o livro (está nos meus planos, mas tem outros à frente na infindável lista de leituras em espera), mas imagino que The Story Solution inclua muitos outros elementos além deste aspeto particular das Hero Goal Sequences. O site do autor aponta algumas pistas, por isso convido à sua exploração para ter uma ideia um pouco mais abrangente.
O Mecanismo de Progressão Dramática
Esta lógica de evolução da estória, baseada em objetivos parciais cuja superação conduz finalmente ao objetivo final, não é verdadeiramente inovadora.
Na realidade, o Mecanismo de Progressão Dramática que já expliquei num artigo do meu curso e que ensino nos meus workshops segue uma lógica semelhante:

Sugiro uma leitura completa do artigo para entender melhor esta infografia (e, já agora, a leitura de todo o Curso — é grátis) mas, muito resumidamente, o Mecanismo de Progressão Dramática assenta na ideia dialética de que:
- O protagonista procura a solução para um objetivo parcial (a tese)
- Encontra resistência, obstáculos e forças antagónicas (a antítese)
- Esse confronto projeta a estória para a frente, às vezes em novas direções (a síntese)
- Estas etapas repetem-se as vezes necessárias até a estória chegar à sua conclusão
Como se vê, o mecanismo de propulsão da narrativa é muito semelhante em ambos os casos. A principal diferença é a forma prescritiva, quase autoritária, com que Eric Edson define exatamente quantas Sequências de Objetivos do Herói deve ter cada ato do filme.
Se tivermos em conta que o próprio conceito de divisão das narrativas em atos é polémico e contestado por muitos autores, podemos considerar que a abordagem de Edson pode ser demasiado limitativa para muitos gostos.
O autor, contudo, defende no final da aula que nos limites estritos que impõe há espaço para toda a originalidade e criatividade. Para o provar, apresenta no seu site diversas análises de guiões bem sucedidos, na maior variedade de estilos e géneros, que segundo ele respeitam escrupulosamente a sua teoria. É o caso, por exemplo, de Back to the Future, Bridesmaids, ou Finding Nemo.
Será verdade? Só experimentando. Quem sabe se as Hero Goal Sequences de Eric Edson não são aquela ferramenta que lhe permitirá desbloquear o guião que parou de escrever há algum tempo?
Conclusão
Como estudioso e praticante da escrita dramática e audiovisual, gosto de descobrir, explorar e conhecer múltiplas teorias e métodos de criação. Já escrevi até artigos sobre algumas, como este ou este. Mas não o faço porque algum destes métodos seja, individualmente, uma fórmula infalível que, seguida meticulosamente, nos conduz inevitavelmente ao sucesso.
Pelo contrário, considero cada um desses métodos apenas como lupas especiais que me permitem olhar para as estórias sob perspetivas diferentes e, através dessa variação do foco, descobrir aspetos novos e detalhes interessantes que talvez valha a pena explorar.

Se tivermos apenas um martelo, todos os problemas têm de ser tratados como um prego. Se tivermos uma caixa cheia de ferramentas diferentes, podemos escolher sempre a melhor combinação para cada problema que nos surge.